quinta-feira, 20 de dezembro de 2007

Dantas Motta em Andrelândia

Por morar em Aiuruoca e exercer a advocacia em toda a região, Dantas Motta muito frequentou minha cidade natal.
Em Andrelândia, depois das audiências e júris, ele ia sempre tomar uma pingas e comer umas lingüiças de porco no bar do Zé Ferreira, juntamente com outros advogados e meu pai, que naquela época também advogava. Quando meu pai me contou não acreditei.
Então alí, no balcão do Zé Ferreira, onde eu também já bebi, na minha pequena Andrelândia, um dos maiores poetas brasileiros, amigo de Mário de Andrade e Carlos Drummond de Andrade, já bebeu com meu pai e seus amigos que pensavam que ele era apenas um advogado.
"Ironias" do País das Gerais!

quarta-feira, 12 de dezembro de 2007

Um poeta caipira

“Você já leu o Dantas Motta?”
Mário de Andrade perguntou a Sérgio Milliet, que respondeu ainda não ter lido.
“Carece”, observou Mário.
Assim Sérgio Milliet inicia a apresentação escrita na “orelha” do livro Elegias do País das Gerais, editado em 1961, pela José Olímpio, do poeta mineiro Dantas Motta.
Elegias do País das Gerais (publicado originalmente em 1946) é considerado pela crítica especializada um dos mais importantes livros de poesia escritos em Minas Gerais, apesar de ser ainda pouco conhecido do público em geral.
Dantas Motta, o autor, nasceu em Carvalhos, então distrito de Aiuruoca, no sul de Minas, em 1913, saindo para estudar Direito na Capital do Estado e retornando para Aiuruoca, onde passou a exercer a advocacia, militando em todo o sul de Minas e São Paulo. Mas sua vocação era a poesia.
Diferentemente de outros grandes escritores mineiros, Dantas Motta não abandonou sua terra natal e, talvez por isso seu nome seja pouco conhecido no cenário da literatura brasileira. Em Aiuruoca trabalhava e escrevia, isolado, no porão de sua casa, onde tinha uma biblioteca com aproximadamente 15 mil livros. Gostava de pescaria, de fumar um cigarrinho de palha e de comer lingüiça e outros derivados de porco sempre regados por doses generosas da autêntica pinga mineira.
Amigo de Mário de Andrade, Murilo Mendes, Carlos Drummond de Andrade, entre outros, Dantas Motta sempre escapulia para São Paulo e Rio de Janeiro para um dedo de prosa com os amigos. Devido a esse estilo de vida, Drummond o classificaria como “o caipira mais civilizado que já vi entre literatos”
Assim era Dantas Motta que partiu definitivamente em 1974, deixando Aiuruoca e Minas Gerais mais tristes.
José Franklin Massena de Dantas Motta, obrigado!

quarta-feira, 5 de dezembro de 2007

Dantas Motta

Éclogas Pequenas em que Fala um Só Pastor

No Sertão das Vacarias o leite e o País
escorriam do mistério e das estrelas serranas.
As vacas, ruminando o tempo,
pastavam o sereno num campo de bíblias.


E foram delas, Joaquina, e foram delas
que Jó nasceu, o Cristo e meu pai.
E o eu sabê-lo morto, mortas sei as invernadas,
por isto, substituindo-o na paterna casa,
aonde agora razão venho dar de mim,


esforço envidei por que corresse ainda,
nas margens de um sentido crepúsculo,
um novo rio que da pobreza manasse.
Tudo o que eu pude dar-vos dela,
em sossego e noite, perdi. Porque a noite,


hoje em mim, é apenas lembrança de poesia,
sol e crescimento. Contudo
nela ainda precisamos crer, Joaquina,
como a morada da paz, da nostalgia
e da conformação, além do que


todos os dias são prisões, nunca exílio.
E se eu em Deus outra vez vier a crer,
e esta carcaça, de novo, Ele se dignar
de bem cavalgar, que o faça à noite
com seus túmulos e suas estrelas,


porque, em verdade, o dia me envelhece.
De fato eu creio que morri.
E quem não morreu, Joaquina?