terça-feira, 27 de fevereiro de 2007

Adélia Prado

Bucólica nostálgica

Ao entardecer no mato, a casa entre
bananeiras, pés de manjericão e cravo-santo,
aparece dourada. Dentro dela, agachados,
na porta da rua, sentados no fogão, ou aí mesmo,
rápidos como se fossem ao Êxodo, comem
feijão com arroz, taioba, ora-pro-nobis,
muitas vezes abóbora.
Depois, café na canequinha e pito.
O que um homem precisa pra falar,
entre enxada e sono: Louvado seja Deus!

Mineira de Divinópolis, Adélia Prado é capaz de poesias das mais belas que se lêem no cenário poético contemporâneo.
Poeta que seduz e encanta.
Sua poesia faz transbordar os sentimentos, o amor. Poesia que dá saudade de alguma coisa, mas que não sabemos bem o que é; que lembra casa de vó no interior de Minas Gerais.
Certa vez Adélia deu uma das melhores explicações a respeito da poesia:

“O dom do poeta é encantar-se com aquilo que é natural porque se passar um boi voando todos vão olhar.
- Olha tem um bezerro voando ali.
Todos vão sair para ver. È fácil falar do extraordinário, mas admirar aquilo que é ordinário... O copo d’água, a cozinha arrumada, o almoço sendo preparado, a vida. Isso que nos é dado a todos, aí mora a poesia.”

Simplesmente maravilhoso!
Adélia Luzia Prado de Freitas, obrigado!

“De vez em quando Deus me tira a poesia
Olho pedra, vejo pedra mesmo.”

Adélia Prado

sexta-feira, 23 de fevereiro de 2007

Quincas Borba

Remexendo em alguns guardados velhos, no armário de meu irmão, eis que encontrei o exemplar de Quincas Borba, mais velhinho ainda, com os mesmos durex colados por minha mãe...

“Rubião fitava a enseada...”

Essa frase me veio à memória antes mesmo que eu abrisse o livro.
É como voltar no tempo...

quinta-feira, 15 de fevereiro de 2007

Livros

Das muitas sensações que um livro desperta, uma é especial: o poder de, a cada releitura, fazer com que você relembre a última vez que o leu, ou a primeira.
O contexto do momento em que você leu aquele livro que agora tem nas mãos novamente. A magia que as páginas do livro têm de fazer aflorar-lhe na mente, o cheiro, os sons, as preocupações, as alegrias que à época da(s) leitura(s) anterior(es) percorriam seus sentidos.
As pessoas queridas com que você conversava sobre o livro ou que estavam ao seu redor no momento da leitura, e que agora não mais estão por aqui.
Lembro-me de quando relia, pela segunda vez, Grande Sertão: Veredas, em 2001, deitado no sofá da sala de minha casa (que agora fica em outra posição) e meu estimado tio e padrinho Guido comentava comigo que havia conhecido pessoalmente o Manuelzão.
Lembro-me também que, lendo pela primeira vez Quincas Borba, aos 15 anos, tendo às mãos um exemplar sem capa, velhinho e destruído, minha querida mãe queria remendar o livro e eu não deixava, pois não queria interromper a leitura e, ainda assim, no outro dia, ao acordar bem cedo, encontrei o livro todo arrumado, colado com durex, em cima da escrivaninha onde eu estudava, (onde foi parar esse exemplar de Quincas Borba?
Onde estará essa escrivaninha que eu tanto gostava?).
Lembro, ainda, de umas férias de julho de muito frio, em que li Levantado do chão, no meu Sítio, quando passei uma semana sozinho, lendo, plantando mudas de algumas árvores e cozinhando minha comida.
Ontem reli alguns poemas de Adélia Prado. Com Bagagem nas mãos, livro que reli quando meu filho nasceu, senti o mesmo frio na barriga sentido na semana em que ele veio ao mundo, até o cheiro do álcool usado para curar o seu umbiguinho me veio novamente às narinas...
E assim vamos nos encantando com a literatura e relembrando, nostalgicamente, de passagens da nossa vida que talvez, se não fosse a leitura de alguns livros, poderiam ficar esquecidas para sempre.

quinta-feira, 8 de fevereiro de 2007

Poética 2010

Todo extremo é prejudicial.
Formalismo exacerbado.
Liberdade em demasia não é o ideal.
Rítimo extremamente compassado.
Entendimento comprometido é banal.

Vanguardas que esquecem a verdadeira
função da poesia: emoção.
Que ignoram a lição primeira.

Palavra que nada diz,
verso que não encanta,
nada falam a ninguém.

Pois que muito formalismo é prisão
e, definitivamente,
liberdade demais não é libertação.

(Poema do livro Ensinamentos de Amor, de Júlio César Meireles de Andrade)

sexta-feira, 2 de fevereiro de 2007

João Francisco e a lua

Meu filhinho de nove meses, João Francisco, quando quer alguém ou alguma coisa, ele estica o bracinho e, dobrando a mãozinha, faz um “gesto de chamar” movimentando os dedinhos. (tudo nele é pequenininho)
Faz isso para mim, para a mamãe, para a vovó, para o cachorro, para os brinquedos, como que chamando para perto dele para que ele possa pegar.
Hoje à noite, eu estava com ele na janela quando veio surgindo uma das mais belas luas cheias que já vi na vida. Muito grande, toda branca-meio-amarelada, num céu azul escuro, das que acredito ter inspirado Catulo da Paixão Cearense.
Admirando o luar, percebi que o João Francisco também olhava a lua.
Com os olhinhos pretinhos brilhando, ele esticou o bracinho e começou a mexer os dedinhos balbuciando: - U, u, u, u!
Ele estava chamando a lua para perto para poder pegá-la...