quinta-feira, 28 de dezembro de 2006

Dr. Pascoal

Quando criança, conheci pessoalmente um poeta de verdade.
É lógico que aos 6 ou 8 anos de idade eu não sabia que ele era um poeta (eu não sabia nem o que era um poeta).
Ele morava em minha cidade e era avô de um amigo meu, além de ser muito amigo de minhas tias, tios e de meu pai.
Como quase todo poeta ele usava grandes óculos de aros pretos e era também, professor de português.
Por ser criança, só o conhecia como avô de meu amigo, obviamente, e, somente quando fiquei maior, vim a sabê-lo poeta, infelizmente após a sua morte, ocorrida em 15 de dezembro de 1993.
Era um senhor engraçado.
Nascido no dia 14 de janeiro de 1925, na Fazenda Retiro dos Dois Irmãos, no município de Madre de Deus de Minas, após formar-se em Direito e ser aprovado no concurso do Ministério Público de Minas Gerais, veio para Andrelândia onde exerceu o cargo de Promotor de Justiça da Comarca, durante 26 anos.
Lembro-me dele, já com os cabelos bem brancos, assentado na varanda, toda de vidro, de sua casa.
Conheci o homem e mais tarde, o poeta, quando tive contato com quase toda sua obra, graças à amizade de sua família com a minha, sendo que minhas tias eram presenteadas com seus livros.
Aquelas poesias tocavam fundo na alma, fazendo com que eu compreendesse melhor uma das principais funções da verdadeira poesia: encantar.
Hoje um busto seu está encravado na praça do Fórum da cidade, devido, logicamente, aos serviços prestados como Promotor Público. Contudo, mais importante e muito mais sólido que o busto de metal, é sua poesia que permanece viva nas vozes e nos corações das gerações futuras.

Francisco Pascoal de Araújo, obrigado!


EVOCAÇÃO N. 1

“E o tempo vem... e o tempo vai...
E eu sou daqui,
Deste retiro imenso de meu pai!

Nestes salões sombrios,
Que me encheram de medo e calafrios
Tenho evocações esmaecentes
De espectros velhos e de estranhos entes.

Anoitecia.
Perdiam-se no crepúsculo empoeirado,
Em notas esvaecidas e suaves
O gorjeio das derradeiras aves
E os últimos mugidos de nosso gado.

Às vezes, na escuridão,
De momento em momento,
Ouvia-se o trilo
De um grilo
Afinando o instrumento
Para a alvorada agreste do verão.

Fora, havia lufadas passageiras,
Cantando estranhos rituais
Nas frondes gigantescas das paineiras
E nas franças inquietas dos bambuais.

Cá dentro, minha mãe
Embalando o berço do menor,
Reunia-nos ao seu redor
E, com voz serena,
Contava-nos histórias de cordeiros
E de José vendido aos estrangeiros...

Todos chorávamos de pena!

No quarto escuro ao lado,
Meu pai, gênio frustrado,
Tocava violino.
E punha nas baladas e estribilhos
A ternura que tinha pelos filhos.

E o tempo vem... e o tempo vai...

Minha alma de poeta se plasmou na infância
Sob a influência desta dupla ressonância:
O acalento tristonho de mamãe,
O violino suave de meu pai.

Sim!
Eu sou daqui.
Deste “Retiro” imenso de meu pai.”

(Francisco Pascoal de Araújo)

4 comentários:

Carrie, a Estranha disse...

Ei, Júlio!

Tô gostando de ver a produção!

Boa lembrança do Pascoal.

Bjs

Anônimo disse...

Definitivamente o nosso saudoso Dr. Pachoal foi uma personalidade fundamental na cultura de nossa tão querida Andrelândia, mesmo não sendo nascido lá, fez as vias de um andrelandense nato.
Tenho que salientar os trabalhos prestados como Promotor de Justiça, pois tenho conhecimento de que o Ilmo. Dr. Paschoal exerceu a promotoria fincada na paz e sempre na justiça da sociedade.

Salve o Ilmo. Dr. Paschoal!!!

Anônimo disse...

Meu nome é Mirna, eu sou neta de Wilson Guimarães.Gostaria de parabenizar e dizer que por acaso chegou em minhas mãos um livro escrito pelo Dr. Pascoal e dedicado a meu avô. Sou estudante de letras e por isso me interessou muito. Gostaria de saber mais sobre Dr. Pascoal já que ele gostava tanto de meu avô!!!!!!!!

Júlio César Meireles de Andrade disse...

Prezada Mirna,
o livro a que se refere é "Os homens de terno kaqui" no qual Dr. Pacoal conta os casos peculiares de sua terra natal, Madre de Deus de Minas e didicado ao amigo Wilsinho, seu avô. Tenho todos os livros de poesias dele reunidos em um volume organizado pelo filho, Pascoal Filho, o Pascoalzinho, grande amigo de minhas tias e de meu pai. Pascoalzinho escreveu também um livro de memórias de seu pai, o saudoso Dr. Pascoal, entitulado "Meu Pai"; já que você quer saber mais sobre a vida deste ilustre promotor e poeta, é, este livro, a fonte certa.
No mais, obrigado pela visita e volte sempre.
Um abraço,
Júlio César Meireles de Andrade