sexta-feira, 26 de janeiro de 2007

João Guimarães Rosa - IV

João Guimarães Rosa e os vaqueiros


“Quando não entendo bem alguma coisa, então não vou conversar com nenhum professor erudito, procuro um vaqueiro velho de Minas, qualquer um deles, pois todos são sábios”
(Guimarães Rosa)


De todas as qualidades da escrita de Guimarães Rosa, uma é especial: o modo como ele trata e descreve o boiadeiro.
Até meados do século passado, os boiadeiros eram vistos como homens rudes e ignorantes, pessoas discriminadas pelo simples fato de terem nascido e sido criados na zona rural, na roça. O homem do campo era considerado um rústico, que não sabia nem falar, a exemplo do personagem de Monteiro Lobato, o Jeca Tatu que vivia á margem da cidade e da História, sempre de cócoras, como se somente na cidade as pessoas soubessem “viver”. “Viver” podia ser entendido como copiar a moda, os costumes e hábitos dos países “civilizados” da Europa.
A elite cultural desprezava qualquer tipo de cultura que viesse do interior.
Vindo do interior de Minas Gerais, Guimarães Rosa, com sua vasta cultura, soube como ninguém descrever o boiadeiro, trazendo, para o centro das atenções, o homem do sertão, que passou a ser valorizado e admirado.
Junto com os personagens vieram, conseqüentemente, os costumes, o ambiente, e toda uma cultura do interior, do sertão, causando uma verdadeira revolução no modo de pensar e até mesmo de agir de toda a sociedade intelectual brasileira da época.
Assim, podemos afirmar que João Guimarães Rosa foi o grande responsável pela quebra das barreiras entre o popular e o erudito, transformando a gente simples do sertão em verdadeiros pensadores e, sobretudo, poetas.
Sejam os vaqueiros verdadeiros, transpostos para os livros, como Manuelzão, Zito e Mariano, ou os vaqueiros-personagens criados através da inspiração sertaneja, José Uéua, Grivo, Noró, Abel, Mainarte e muitos outros.
Seja na simplicidade da listinha, anotada em um caderno, dos nomes das vacas do Sr. Zito, vaqueiro e cozinheiro: “Farofa, Despedida, Carvoeira, Paquinha, Violeta, Metrage, Sembléia...”
Seja na beleza das palavras do vaqueiro José Uéua: “No coração a gente tem é coisas igual ao que nem nunca em mão se pode ter pertencente: as nuvens, as estrelas, as pessoas que já morreram, a beleza da cara das mulheres...”
Grande boiadeiro das palavras e sentimentos, João Guimarães Rosa, muito obrigado!

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